Ser mulher, ser liderança
Desde os anos 1980, povos de todo o país passaram a se articular em torno de organizações indígenas, conselhos e assembleias próprias. Agora esse fenômeno é capitaneado também por mulheres indígenas, como Leonice Tupari, presidenta da recém-fundada Associação das Guerreiras Indígenas de Rondônia (AGIR), e Telma Marques Taurepang, secretária do movimento de mulheres indígenas do Conselho Indígena de Roraima (CIR).
“A luta é uma coisa assim... tem que estar no sangue.”
Leonice Tupari conta um pouco da sua trajetória no movimento indígena desde 2000, quando percebeu que as mulheres indígenas se sentiam menos valorizadas e precisavam assumir novos espaços em busca de melhorias para seu povo e para si mesmas. Vive na Terra Indígena Sete de Setembro, no município de Cacoal, Rondônia. Desde 2009, ela é Conselheira da União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira (UMIAB). Também está à frente do Departamento de Mulheres da Associação Metareilá, faz parte do Conselho Municipal do Direito da Mulher no município de Cacoal e é a responsável pela loja Arte Paiter, estimulando o artesanato tradicional das mulheres do povo Suruí Paiter.
“Hoje eu também estou aqui como multiplicadora da ONU Mulheres que foi uma coisa assim que a voz das mulheres indígenas junto com a ONU Mulher me fez grandes esclarecimentos e evoluiu bastante dentro da minha comunidade e na base do povo paiter. E na região ali a gente tá levando isso adiante. Levando essa voz das mulheres da nossa região mais adiante. Mas assim, a luta é uma coisa assim... tem que estar no sangue. A gente tem que sentir a nossa origem pra gente poder valorizar o que hoje a gente vem participando. Essa luta, ela só vem se fortalecer quando a gente realmente quer buscar alguma coisa que nos interessa e que nos auxilie pro nosso futuro. Porque hoje a gente vive num mundo, querendo ou não querendo, num mundo machista”.
“Enquanto houve uma mulher, sempre nascerá um guerreiro, sempre nascerá uma guerreira”
Telma Marques Taurepang vive na Terra Indígena Araçá, na região do Amajari, em Roraima. Está na luta pela garantia dos direitos das mulheres desde a década de 1990 e assumiu o Departamento de Mulheres do Conselho Indígena de Roraima (CIR) em 2010. Ela fala a Leonice Tupari das dificuldades comuns e dos avanços que já conquistaram na busca pela igualdade de gênero e no fortalecimento em mostrar ao mundo branco o que isso significa para as mulheres indígenas.
“As mulheres indígenas sempre participaram dessas lutas junto com as suas lideranças, junto com os seus caciques. Elas sempre tiveram também ao lado deles. Estamos conseguindo fazer com que as lideranças, elas vejam as suas mulheres não como objeto, mas como mulheres guerreiras que lutam com eles para o fortalecimento e o bem viver das nossas aldeias e das nossas comunidades, para o fortalecimento das nossas famílias. Existem muitas mulheres que apesar de terem um esclarecimento e uma visão, ainda são impedidas de estarem em nossas oficinas, em nossos encontros e nas nossas rodas de conversas. Quando falo que houve um grande avanço em relação também às mulheres acadêmicas, nas universidades, que estão ali se empoderando dos seus direitos, da sua liberdade de expressão. Quando elas vão para a universidade, elas lutam para uma igualdade, para que haja o entendimento, para que seu povo lhes vejam e lhes reconheçam como mulheres guerreiras.E digo mais: enquanto houve uma mulher, enquanto existir uma mulher no nosso planeta terra, na nossa mãe terra, sempre nascerá um guerreiro, sempre nascerá uma guerreira, para dar continuidade à nossa luta. A nossa luta ela não vai parar, ela não vai cessar aqui”.