Jovens mulheres em luta

No sul do estado de Mato Grosso do Sul, os povos indígenas vivem uma situação de vulnerabilidade e de violação de direitos humanos que já foi classificada inúmeras vezes como genocídio. Por isso, convidamos duas professoras indígenas, que estão se formando na Faculdade Indígena da Universidade Federal de Dourados (Faind/UFGD), para falar de suas realidades: Lisandreia Guarani, do povo Ava Guarani, e Inaye Gomes Lopes, do povo Kaiowa.

“Se nós acabamos com a natureza, o que vai ser de nós mais tarde?”

Inaye Gomes Lopes tem 28 anos, é professora e vive na Terra Indígena Ñanderu Marangatu, no município de Antonio João (MS). É a terra em que está enterrado o líder guarani Marçal de Souza Tupã’i e onde, em 2015, foi morto o jovem Simião Vilhalva, após um ataque de pistoleiros contra a retomada de uma porção do território tradicional pelos Kaiowa. Filha de uma grande liderança do povo Kaiowa, Hamilton Lopes, a professora Inaye conta um pouco da história de luta, que ela estudou com profundidade para escrever o trabalho de conclusão na Licenciatura Intercultural Teko Arandu.

“Eu penso assim dos grandes empresários: o dia em que eles comerem uma cédula de dinheiro no prato, como se fosse uma folha de verdura, a ficha deles vai cair. Os políticos lá em cima estão brigando pelos poderes e enquanto isso estamos passando por essa dificuldade, nessa situação de conflito pela terra. A gente não quer perder mais vida, porque o Simião morreu na reocupação que a gente fez em 2015. Os fazendeiros acabaram com a nossa mata, os nossos rios estão secos, temos que correr atrás do que a gente precisa e do que é nosso por direito, porque já foi demarcado. A gente não vai esperar por muito mais tempo, porque a gente tem que agir.”

“A violência não vai conseguir nos deter”

Lisandreia Santos, do povo Ava Guarani, é professora e vive na Terra Indígena Pirajuvy, em Paranhos, na região de fronteira do Mato Grosso do Sul com o Paraguai. Ela fala da situação de vulnerabilidade de sua comunidade, que retomou terras que lhes são de direito, mas foram violentamente expulsos, e da sua recente entrada na universidade: “Meu objetivo de estar na universidade não é só pra ser graduada, é pra ajudar o meu povo Guarani Kaiowa e Guarani Nandeva”.

“Temos as nossas retomadas, no Ypo’ i mesmo, perdemos dois professores que sempre ajudaram a nossa comunidade. Quem tem coragem de enfrentar perdeu a própria vida pela comunidade, pra recuperar as nossas terras. Tudo que a gente quer é a nossa terra, de onde fomos forçados a sair. Nas retomadas as mulheres sofrem muito porque eles ameaçam. Os pistoleiros que entram fazem violência, estupram, agridem mesmo. Eu me defini uma guerreira e uma mãe já desde pequenininha. Tudo que eu estou compartilhando é em nome das mulheres da minha comunidade. Eu só tenho que dizer que a gente não e frágil - as mulheres não são frágeis não, como todo mundo pensa. A gente é frágil pode ser na forma física, mas a gente não é frágil nas nossas falas, na nossa cultura. A violência não vai conseguir nos deter”